sábado, 6 de junho de 2015


O livro me chegou na transição para a segunda infância, como dom materno e afirmação do rito de passagem alfabetizada. Ganhava acesso a um mundo distinto, em que  seriam fartas as situações e imagens construídas pela escrita. Um dom que se recebe costuma pedir retribuição, seja pela alegria da oferta, seja pelo compromisso suscitado.

Não é ingênuo nem vai de coração limpo quem presenteia livros, dom que cobra exigência por sua própria natureza de objeto-síntese da acumulação escrita e transmissão de narrativas e conhecimento. De minha parte, mantive tanto alegria quanto compromisso, o que implica presentear livros com frequência, tomá-los como referência em minhas práticas. Leio livros, consulto livros, leio em voz alta para pessoas ao meu redor.

Recomendo a leitura oral expressiva, com atenção à entonação para as diferentes marcações indicadas no texto, tais como sinais de pontuação ou informações referentes aos tons das falas dos personagens. A voz humana, modulada, é canal essencial à integração da criança no conjunto de herdeiros e herdeiras dos bens simbólicos da humanidade manifestados em estado de palavra, tanto oral quanto escrita.

(Nilma Lacerda Tortura e Glória: Fugas na ordem dos livros)